Padre da capital acolhe 74 sírios que fugiram da guerra. Pároco nascido no país árabe e residente em BH coordena ação de apoio aos imigrantes.
Ao fim de uma aula de engenharia de computação, o jovem sírio Ahed Abbas, 21, voltava para sua casa e nem sentia que a morte se avizinhava. Dez minutos depois de sair da faculdade, um bombardeio destruiu tudo no caminho por onde ele passava todos os dias. Por pouco, Abbas escapou do pior. O desespero o consumiu e, para viver, o jeito foi abandonar seu país. “Você vai à aula e não sabe se vai voltar. Por isso, meu pai nunca mais me deixou ir à faculdade. A qualquer momento pode cair uma bomba”, disse o rapaz, confortavelmente sentado no sofá de um amplo apartamento alugado no centro de Belo Horizonte, após um dia de trabalho em uma padaria onde aprendeu a fazer pães, bolos e biscoitos.
No imóvel, Abbas mora com outros nove refugiados sírios que escolheram a capital mineira para refazer suas vidas e fugir da guerra civil que assola o país árabe desde 2011. O sorriso dos jovens na foto acima esconde um passado recente de muita dor e tristeza, como Majed Ibrahem, um estudante de engenharia metalúrgica de 22 anos que perdeu o pai na guerra e teve que vir ao Brasil trabalhar como auxiliar de limpeza.
Ou como Flayed Flaieh, 21, que a 10 mil km de casa tenta consolar os pais, que passam dias chorando a perda de outro filho, de 27 anos, que foi servir ao Exército sírio e foi morto. “Estou com muita saudade dos meus pais, mas eles sabem que eu estou a salvo. É muito bom estar aqui”, contou em inglês, já que a maioria deles quase não fala português.
Desde o início de 2014, o padre George Rateb tem acolhido os refugiados oriundos da Síria – já são 74 imigrantes cristãos, divididos em 16 apartamentos em vários bairros da cidade. O pároco, que também é sírio, comanda a Igreja Sagrado Coração de Jesus, no bairro Santa Efigênia, na região Centro-Sul. “Tentamos tirá-los daquela tragédia motivada por uma guerra injusta, que já vai completar cinco anos. Lá, eles poderiam até ser obrigados a participar de grupos armados”.
Com idades de 19 a 34 anos, os refugiados – a maioria homens – querem ter a chance de recomeçar. O veterinário Michel Splipy, 31, evitava sair na rua e teve que abandonar o trabalho nos arredores de Homs, terceira maior cidade da Síria, dominada pelas forças do Estado Islâmico. “Agora trabalho na lanchonete de uma escola, mas o salário é muito baixo”, ponderou. De sua renda de R$ 850, R$ 300 vão para o aluguel do apartamento.
Ajude
Juntos pela Síria. Doações em dinheiro para ajudar os refugiados sírios podem ser feitas em nome da Arquidiocese de Belo Horizonte: Banco do Brasil, agência 3494-0, conta corrente 30351-8.
Sírios no Brasil
Situação. O Brasil acolhe mais sírios do que países da rota europeia de refugiados e também se comparado com a América Latina.
Números
Segundo dados divulgados pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), 2.077 sírios receberam refúgio do governo brasileiro de 2011 até agosto deste ano. Eles formam o maior contingente de refugiados do país. Na Espanha, foram 1.335. Nos Estados Unidos, 1.243, e 1.005 na Itália.
Cenário sem perspectiva de melhora
Além de ser grave, a situação da Síria não tem perspectiva de melhora. Segundo Danny Zahreddine, professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC Minas, um terço do território sírio é dominado pelo grupo terrorista Estado Islâmico, e o cenário é devastador.
“Na cidade de Palmira, onde havia ruínas romanas, templos de mais de mil anos têm sido implodidos. O principal arqueólogo do país foi degolado em praça pública no mês passado. Talvez essa seja a pior crise internacional desde a 2ª Guerra Mundial”, avaliou o docente.
Imigrantes cristãos são confundidos com terroristas
Enquanto os sírios tentam se habituar ao Brasil, um país completamente diferente do deles, um problema incomoda: a recepção nada hospitaleira de alguns brasileiros. Discretos e muito agradecidos ao refúgio, eles evitam reclamar, mas o padre George Rateb não deixa escapar. “Teve uma vizinha que colocou o dedo na cara de um deles e disse: ‘Eu que estou aguentando vocês aqui’, como se alguém tirasse o salário dela e desse aos refugiados”.
Segundo o pároco, alguns sírios estão sendo tratados como se fossem terroristas membros do Estado Islâmico. “(Alguns brasileiros) parecem não saber a diferença entre um refugiado e um jihadista”. Jihadista é aquele que adere à luta violenta crendo que irá restaurar a lei de Deus na Terra e defender a comunidade muçulmana.
O estilo de vida urbano, com medo de ser assaltado, também passa a ser incorporado. “Lá, eles vivem em casas, não estão acostumados a esses apartamentos como latas de sardinha. Não têm portaria, cerca elétrica nem o hábito de fechar a janela para dormir. Eu digo a eles: ‘Não pode, não pode, não pode’. Virei o homem das regras”.
Apesar dos cuidados, a violência também já atingiu os imigrantes. Um deles foi assaltado na semana passada. Outro que trabalha como balconista em uma padaria foi agredido, e foi preciso acionar a polícia. “Um senhor jogou um copo de café com leite na cara dele. Disse que refugiado vinha para dominar o Brasil”, lamentou o padre.
Mesmo com todos os problemas, os refugiados quase não reclamam. “Quero trazer minha namorada para cá e casar. Os brasileiros me ajudam muito. Nos outros países eles não queriam os sírios”, avaliou Ahed Abbas.
Fonte:
5 respostas para “Diante do drama dos refugiados, um exemplo a ser seguido”
Francisco convoca a nós cristãos a não ficarmos indiferentes…
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Esse é o nosso desafio Joelma. Aqui em Belo Horizonte já há grupos organizados para concretizar ajuda humanitária.
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Obrigado Joelma por participar do Observatório da Evangelização.
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Como outras paróquias da Arquidiocese, poderão fazer para ajudar aos refugiados ? Penso que o apelo do Papa toca a todos nós…
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Sim, cabe às lideranças de cada paróquia, comunidade ou grupo reunirem-se, discutir a questão e descobrir formas criativas de se mobilizar para ajudar.
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